A
diversidade como riqueza
—
Estava aqui pensando... A gente acaba convivendo com tantas coisas diferentes
no dia a dia...
— Será que ainda vamos entender tudo isso?
— E, mesmo que a gente entenda, será que vamos ter de
achar tudo bom?
— Deus me livre! Só faltava eu ter de gostar de
miolo! Será que não vamos mais poder fazer só o que gostamos?
Gostar de tudo é a questão que queremos discutir,
afinal gostamos mais daquilo com que estamos acostumados. Se desde pequenos
comemos bife e batata frita, vai ser difícil passarmos a comer miolo.
Entretanto, acredite, há pessoas que gostam de miolo!
Do mesmo jeito, se só vemos filme de ação, será que
vamos acompanhar com prazer um filme que se desdobra lentamente, por meio da
apresentação de aspectos psicológicos dos personagens? Mas, por sua vez, tem
gente que gosta tanto de drama como de comédia, de ficção científica e até de
filme de arte.
Com relação a pessoas acontece o mesmo: gostamos dos
nossos amigos porque temos alguma coisa em comum com eles, porque desenvolvemos
uma relação de amizade ao longo do tempo, não de uma hora para outra. O que não
quer dizer que as únicas pessoas legais do mundo sejam os nossos amigos!
Existem muitas outras pessoas que podemos conhecer e admirar!
O importante é compreender que a diversidade
existente no mundo é uma riqueza, é uma fonte inesgotável de novas
possibilidades para cada um de nós. Conhecer outros modos de pensar, de viver,
de falar, de crer nos dá a possibilidade de ver o mundo por uma perspectiva
diferente daquela com a qual estamos acostumados. Dessa forma a nossa
compreensão do mundo se amplia e temos a oportunidade de escolher como queremos
conduzir a nossa vida.
Assim como temos o direito de ser a pessoa que somos
e de escolher o que queremos para nós, os outros também têm esse mesmo direito.
Portanto, o respeito mútuo é a chave da vida em sociedade: respeito pela
natureza, por todos os seres humanos, pelas diferentes culturas como expressões
de experiências de vida e de necessidades diversas.
[...]
Considerando o mundo cultural, vemos que a riqueza se
torna quase infinita. Da Pré-História até nossos dias, quantas realizações
humanas! Realizações políticas, religiosas, artísticas. Acrescentam-se as
formas de convivência social, familiar, os hábitos de nossa vida diária, os
costumes que regem nossa alimentação. Quantas línguas foram criadas nesse
espaço de tempo! A criatividade humana é realmente inesgotável e é a
pluralidade cultural que torna o mundo atraente, interessante, curioso e
surpreendente.
Cada um de nós nasce e cresce dentro de uma cultura,
aprendendo a língua materna seguindo hábitos e costumes de um determinado
grupo, crendo em certos princípios e dogmas religiosos. Essa cultura comum
fortalece os laços entre os indivíduos do grupo, faz com que eles pensem não só
como pessoas isoladas mas também como um conjunto que partilha uma mesma visão
de mundo, os mesmos valores.
Toda essa herança cultural pode ser transformada,
alargada em seus horizontes, ao contrário de nossa herança genética, que não
pode ser mudada, pelo menos por enquanto. Conhecer uma outra cultura é quase
como tornar-se criança outra vez: é enxergar a realidade por outros olhos.
Exige de nós o esforço de nos colocarmos dentro de um outro sistema de valores,
de usos e costumes para tentar compreendê-los em sua lógica interna.
Do ponto de
vista cultural, não existe cultura certa e cultura errada, superior ou
inferior. A cultura do Rio Grande do Sul, por exemplo, não é melhor ou pior do
que a cultura do Piauí, assim como a cultura norte-americana e a européia não
são superiores à cultura brasileira. Cada cultura é adequada ao grupo que a
cria para expressar a visão de mundo específica desse grupo.
Muitas vezes, o modo pelo qual nos habituamos a
viver, a pensar o mundo e a nos relacionar com o divino pode nos parecer como
sendo o único modo certo. Entretanto, os outros modos culturais não são
errados, são apenas diferentes. Não precisamos adotá-los, só respeitá-los,
reconhecendo que têm tanto valor quanto os nossos. Comer com hashi (aqueles pauzinhos japoneses) é
diferente de comer com os dedos ou com a colher e o garfo. Só isso.
É claro, porém, que cada cultura propõe valores que
sempre podem ser analisados no sentido de saber se são adequados a toda a
humanidade. Sabemos que existem obras de cultura que promovem a violência, o
racismo, o preconceito. É só ligarmos a televisão para encontrarmos exemplos
disso em filmes, novelas e programas de variedades. Essa “cultura” precisa ser
recusada porque nos leva à barbárie, ao caos, e não nos ajuda a nos tornar mais
humanos. Cultura é “aquilo que é cultivado, cuidado”, que cimenta as relações
humanas e ajuda a criar uma sociedade mais justa.
O conhecimento de outras culturas, portanto, nos
torna mais flexíveis, mais tolerantes, mais respeitosos. Acima de tudo, esse
conhecimento nos possibilita descobrir do que realmente gostamos e do que não
gostamos; afina o nosso gosto, abre alternativas para a construção de um
projeto de vida mais rico, diferente e único. Porque é o nosso projeto, de ninguém
mais.
Conhecimento sozinho não basta. É necessário que ele
venha acompanhado da prática cotidiana do respeito e da tolerância por todos
aqueles que são diferentes de nós ou que pensam de modo diferente, a partir de
outros valores igualmente humanos.
Maria Helena Pires Martins. Somos todos diferentes!: convivendo com a
diversidade do mundo. São Paulo: Moderna, 2001.p.42-6. (Aprendendo a
com-viver).
Dogmas: crenças.
Barbárie: selvageria.
1. O texto é construído com base em uma ideia central.
a) Que ideia é essa?
b) De acordo com o texto como as pessoas devem agir em
relação à diversidade cultural?
c) Segundo a autora, qual é a importância de conhecer
outras culturas?
2. A autora explica o porquê de gostarmos de uma coisa e
não de outra. Qual é a justificativa que ela dá para isso?
3. Em determinado momento do texto, é explicado como as
pessoas se inserem em uma cultura. De que forma isso ocorre?
4. O texto evidencia a riqueza cultural, destacando seus
aspectos positivos, porém cita alguns exemplos negativos exibidos em filmes,
novelas e programas de televisão.
a) Identifique alguns aspectos negativos.
b) Segundo a autora, por que eles devem ser evitados?
5. Em relação a outras culturas, a autora afirma que não
é necessário tomá-las como nossas. No entanto, destaca que é preciso
aprendermos a respeitá-las, para que sejamos mais flexíveis e tolerantes com a
diversidade. O que a autora propõe para isso?
6. De acordo com o texto, a diversidade “nos dá a
oportunidade de ver o mundo por uma perspectiva diferente daquela com a qual
estamos acostumados.”. Explique essa afirmação.
7. Releia o seguinte trecho:
Assim como
temos o direito de ser a pessoa que somos e de escolher o que queremos para
nós, os outros também têm esse mesmo direito. Portanto, o respeito mútuo é a
chave da vida em sociedade...
a) Alguma vez você se sentiu desrespeitado ou presenciou
uma atitude de desrespeito por outras pessoas? Como você se sentiu?
b) É possível afirmar que atitudes como as indicadas
nesse trecho podem contribuir para a construção de uma sociedade mais justa,
sem preconceitos e rica culturalmente? Por quê?
Explorando a
linguagem
1. Releia o seguinte trecho: “Entretanto, acredite, há pessoas que gostam de miolo!”.
a) A quem a autora está se dirigindo? Explique sua
resposta.
b) Quais palavras a seguir podem substituir o termo em
destaque, mantendo o sentido da frase?
mas – nem – porém – logo
c) Que sentido essa palavra atribui à ideia expressa:
soma, oposição ou conclusão?
2. As reticências assumem diferentes funções de acordo
com o contexto em que são inseridas. Elas podem interromper uma ideia, marcar
uma hesitação ou também apelar para a imaginação do leitor.
Com
que objetivo as reticências forma empregadas no trecho: “— Estava aqui
pensando... A gente acaba convivendo com tantas coisas diferentes no dia a
dia...”?
3. No trecho “Comer com hashi [...]”, por que o termo foi destacado em itálico?
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